A água parada reflete o céu, mas esconde o que está sob o lodo. Assim é o conservadorismo em Mato Grosso do Sul: uma superfície de certezas que mascara raízes podres. Nesta história, quatro personagens — um fazendeiro, uma professora, um político e um policial — descobrirão que a ordem que defendem é um castelo de areia. O Pantanal sussurra: "Toda hierarquia é uma mentira que alguém decidiu acreditar."

### A Terra que Engole Verdades

 

No Pantanal, vivia João Urbano, 58 anos, fazendeiro, defensor da "família tradicional". 

Ele descobre que o filho caçula, Lucas, de 17 anos, escreve poesias sob o pseudônimo Luna. 

João confronta Lucas: "Poesia é coisa de viado?" 

Enquanto queima os cadernos do filho, João vê, nas chamas, o rosto do próprio pai, que o espancava por chorar no velório da mãe. 

O que é mais frágil: a heterossexualidade que você exige ou o menino que você foi, obrigado a calar seu pranto?

### A Sala de Aula onde Deus Morre 

Ana Beatriz, 34 anos, professora de História, era uma evangélica fervorosa. 

Um aluno transgênero lhe pergunta: "Se Deus me fez assim, por que a senhora me chama de aberração?"

Ana recita versículos, mas sonha todas as noites com Maria Madalena lavando os pés de Judas. 

Ela encontra, no Arquivo Público de Campo Grande, documentos de 1930 onde freiras católicas esterilizavam indígenas "para salvar almas". 

Quantos corpos foram sacrificados no altar da moralidade que você chama de "lei natural"? 

### O Dinheiro que Sangra

Senador Otávio Ribero, 61 anos, líder de partido conservador, "campeão do agronegócio". 

Um operário morre esmagado em um silo de soja sem inspeção. 

Otávio recebe um relatório: "Acidentes como este aumentam lucros em 7% ao ano."

Ao visitar o velório, ele vê o filho do morto — um menino de 6 anos — desenhando um trator com sangue de barbante. 

Quando você fala em "liberdade econômica", está se referindo à liberdade de explorar ou à liberdade de não ter um pai? 

### A Arma que Vira Contra

Capitão Renato Almeida, 39 anos, era considerado um heroí da "guerra às drogas". 

Ele ordena uma operação que mata um traficante adolescente… e sua irmã gêmea, grávida. 

Renato descobre que o traficante era informante da Polícia Federal. 

Na cena do crime, ela encontra uma Bíblia aberta em Ezequiel 25:17 — "Retribuirei com furor a vingança."

Quantas balas você disparou para esquecer que seu irmão está preso por matar o homem que estuprou sua mãe?

### O Fogo que Purifica Nada 

Os quatro se encontram num comício pró-armas em Três Lagoas. João vê Lucas na multidão, de mãos dadas com um rapaz. Ana reconhece o aluno transgênero segurando um cartaz: "Deus me ama. E você?" Otávio é confrontado pelo menino do velório. Renata aponta a arma para a própria sombra. 

Um índio Terena, ancião da Aldeia Buriti, ascende uma fogueira com os símbolos do agronegócio, Bíblias e armas. "O fogo não purifica — só mostra o que já estava podre."

### A Única Hierarquia que Resta

O Pantanal inunda a cena. Água suja apaga o fogo. Na lama, flutuam perguntas: 

1. Se sua tradição exige ódio, não será você o herege?

2. Quantos "pecadores" precisam morrer para que seu céu fique limpo?

3. Quando você diz "Deus", não está apenas pedindo desculpas por seu medo?

O único julgamento que importa é o do rio Paraguai: ele leva tudo, mas devolve, nos peixes, os metais pesados de suas certezas. 

"No Mato Grosso do Sul, até a direita tem dois lados — o que mostra e o que apodrece debaixo da botina."

### Nota da Autora: 

Esta história não quer destruir crenças — quer perguntar se você as escolheu ou se foram plantadas em você como soja transgênica. O Pantanal não mente: toda água parada um dia seca. O que restará de você quando o espelho se quebrar?