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A Última Máquina por (Tácito Loureiro)

Publicada em: 28/04/2025 07:18 - Geral

Ninguém lembrava mais como era antes da Máquina.

Quando ela chegou, disseram que era para ajudar, para tornar o trabalho mais leve, mais seguro.

Mas bastou um ano para entender: a Máquina não se preocupava com quem a operava.

Mateus sempre foi ágil. Trabalhou dez anos na fábrica, nunca teve uma única falta, uma única advertência. Quando a nova linha de produção foi instalada, ele foi um dos primeiros a ser treinado. Mas o treinamento? Duas horas apressadas, sem prática real. Sem tempo de adaptação. Sem direito a recusar funções para as quais ele não se sentia preparado.

Até que num dia como hoje, 28 de abril, a luva dele enroscou num eixo exposto.

Um segundo.

Foi só um segundo.

Mateus sobreviveu — mas perdeu a mão.

A fábrica fez uma homenagem discreta. Um buquê, uma carta assinada pela diretoria, promessas vazias de "análise de riscos". Mas nada mudou. Nenhuma indenização justa. Nenhuma garantia de reintegração. Nenhum suporte psicológico. Apenas uma esperança morta no olhar dos colegas, que voltaram ao trabalho com medo e silêncio.

Se o Brasil tivesse, como em outros países, o que Mateus nunca teve...

Direito à recusa do trabalho em condições inseguras, como no Canadá e na Suécia, onde o trabalhador pode legalmente interromper a tarefa se identificar risco grave à sua saúde ou segurança – sem medo de retaliação.

Treinamento obrigatório e contínuo sobre segurança, como na Alemanha, onde as empresas devem garantir formação técnica anual sobre todos os riscos do posto de trabalho, com controle sindical.

Indenização automática por acidente de trabalho, como na Bélgica, sem que o trabalhador precise travar batalhas judiciais humilhantes para provar o óbvio.

Acesso imediato a suporte psicológico e reabilitação profissional, como na Noruega, onde cada acidente aciona uma rede integrada de acolhimento, terapia e capacitação para novas funções.

Participação obrigatória dos trabalhadores nas decisões de segurança, como na França, onde os Comitês de Saúde, Segurança e Condições de Trabalho têm poder deliberativo, não só consultivo.

Hoje, Mateus reivindica melhores condições de trabalho.

Não apenas por si.

Mas por todos.

Ele criou um movimento: “Nós Somos a Mão Que Faltava”.

Um grito pelo que falta em cada chão de fábrica, em cada canteiro, em cada escritório invisível.

Porque 28 de abril não pode ser só um dia de memória.

Tem que ser o marco de uma nova história: onde a segurança não seja uma promessa, mas um direito vivo.

E onde nenhuma outra mão, nenhum outro sonho, tenha que ser perdido para que o trabalho continue.

Porque vidas valem mais que produção. Sempre.

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