Tocando Agora: ...

Coração Pantaneiro do Mundo (por Tácito Loureiro)

Publicada em: 05/11/2025 23:56 -

 

Coração Pantaneiro do Mundo

 

Nasce o dia entre guavirais e cantigas,  

a névoa respira no dorso do Rio Miranda,  

onde o ar sabe a lenda que não se investiga  

e o tempo escuta o que a terra ainda manda.

 

O sol abre ferida vermelha no brejo.  

O homem — chapéu de palha, reza muda —  

sabe que o campo não perdoa desejo,  

mas aceita quem chega com a mão nua.

 

Mato Grosso do Sul: não palavra, pulso.  

Guarani, espanhol, fronteira — três línguas  

bebendo da mesma canoa. O convulso  

corpo que a História acorda em línguas.

 

Trem do Pantanal: sanfona que não chora,  

testemunha. Berrante anunciando  

não o boi — o homem que se enamora  

quando junho vira fogo e quando.

 

Paraguai: tereré circula.  

Não a cuia — o silêncio aceito  

entre goles. Amizade que calcula  

nos linderos o quanto cabe no estreito.

 

Feira de Dourados, chipa pastel mandioca:  

não alimenta a boca.  

Alimenta.

 

Corumbá tambor. Campo Grande viola sobá.  

Amambai reza tentando segurar  

o que o asfalto —

 

Mas o povo não resiste: vive.  

Recolhe pólen, entorta aço,  

canta o chamamé porque o sagrado  

nasce em cada passo, não se persegue.

 

Há quem pesque versos no Taquari.  

A rede vem com peixe e palavra.  

Há curandeiras: não veem futuro ali,  

enxergam agora no voo da arara.

 

O sul-mato-grossense pressente:  

viver não se atravessa.  

Se está.

 

Crepúsculo no Pantanal:  

silêncio cheira a capim  

e a

 

E o poeta escuta o tereré  

passando de mão  

em mão

 

escreve porque a cultura  

não é ponte

 

é a sede

Compartilhe:
Comentário enviado com sucesso!
Carregando...